segunda-feira, 30 de junho de 2014

Diário de um cínico*

Um dos mitos correntes da política internacional, sobretudo à esquerda, é o de que os nacionalismos europeus morreram em 1945, sendo a União Europeia a prova da sua morte. Notícias um pouco exageradas, parece-me. O que hoje se vê, talvez porque a própria UE não se sente lá muito bem, é um regresso dos nacionalismos (para quem acreditou que eles se tinham ido embora, claro). Em França, em Inglaterra e na Hungria, partidos nacionalistas ganharam as últimas eleições. A Escócia pode vir a separar-se do Reino Unido por referendo, tal como a Catalunha da Espanha. A saúde da Bélgica, dividida entre flamengos e valões, já conheceu melhores dias. Em Itália, o Norte também ameça de quando em vez com o divórcio. Mais a leste, a Ucrânia vive um clima de guerra civil entre as regiões ocidentais e as russófonas. Etc.
Na verdade, assistimos não só a um regresso dos nacionalismos, mas a uma irónica repetição de 1918. A derrota na I Guerra Mundial causou a o fim dos multiétnicos impérios otomano e austro-húngaro. O ressurgimento de nacionalismos históricos como o escocês, o catalão ou o flamengo pode vir a desintegrar o Reino Unido, a Espanha ou a Bélgica, estados resultantes da união, nem sempre pacífica, de nacionalidades pré-existentes. Curiosamente, a Alemanha, nação maldita da Europa, tem sido das poucas a escapar aos ventos do separatismo e foi mesmo a única a alargar (ou a recuperar) as suas fronteiras depois de 1989. Quem diria que o nacionalismo alemão, causador e vencido de duas guerras mundiais,  seria o grande vencedor da Guerra Fria?

*Post recuperado.

3 comentários:

  1. humm... não sei que assegurava essa morte. Bastaria ler o Conde de Marenches ou o Savage Continente do Kershaw para saber que não era assim.
    Talvez tenhas querido dizer que era um wishfull thinking e não percebi.

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  2. Sim, o que quero dizer é que não passa de wishful thinking, com muito wishful e pouco thinking. E, em nota mais trágica, que o lugar comum tão universalmente repetido não faz nada, mesmo nada, pela paz na Europa. Como, de resto, o lugar comum que garantia a bondade civilizadora dos impérios em 1914.

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